TJBA 27/10/2022 -Pág. 602 -CADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA -Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.207- Disponibilização: quinta-feira, 27 de outubro de 2022
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I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo
familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados,
unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de
coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. (grifamos).
No caso dos autos, os elementos indicam que entre o suposto agressor e a pretensa vítima não há relação familiar ou íntima de
afeto, a fazer incidir as regras protetivas da Lei Maria da Penha. Avulta dos autos a ocorrência de eventual e episódico relacionamento extraconjugal entre as partes, sem constituição de vínculo afetivo ou familiar que conduza à compreensão dos fatos como
sendo violência doméstica, nem de que tenha se dado em razão de gênero ou em contexto de hipossuficiência ou vulnerabilidade
da ofendida.
Ademais, como desdobramento de sua natureza provisória, a manutenção de toda e qualquer medida protetiva de urgência depende da persistência dos motivos que evidenciam a urgência da medida necessária à tutela. São as medidas cautelares situacionais, pois tutelam uma situação fática de perigo. Isto é, desaparecido o suporte fático legitimador da medida, consubstanciado
pelo fumus comissi delicti e pelo periculum in mora, deve o Magistrado revogar a constrição. Por isso é que a decisão que decreta
uma medida cautelar, mesmo que de caráter satisfativo, sujeita-se à cláusula rebus sic stantibus, pois está sempre sujeita à nova
verificação de seu cabimento, seja para eventual revogação, quando cessada a causa que justificou, seja para nova decretação,
diante do surgimento de hipótese que a autorize (art. 19, § 3º, e 20, parágrafo único, da Lei nº 11.340/2006).
Logo, uma vez decretada qualquer das medidas protetivas de urgência, ou até mesmo a prisão preventiva do agressor, mudanças do estado de fato subjacente ao momento de sua decretação ou mesmo o surgimento de novas provas que alterem o convencimento judicial sobre o fumus comissi delicti ou o periculum libertatis podem levar a necessidade de revogação da medida;
substituição da medida por outra mais benéfica ou mais gravosa; reforço ou atenuação da medida.
Na espécie, observa-se que não há lastro probatório mínimo para a manutenção das medidas protetivas. Isto porque as medidas
protetivas foram concedidas com fundamento no relato de supostas ameaças a sua ex-companheira e a pratica de agressões
físicas e verbais, em tese por não aceitar o fim do relacionamento. Ademais, destaco que a requerente não deseja a manutenção
das medidas protetivas conforme declaração na Defensoria Pública.
Com efeito, além de inexistir vínculo afetivo e familiar entre as pares, concluo que ausente qualquer demonstração de perigo
atual, a justificar a manutenção da medida cautelar. Reforça esta conclusão o parecer do Ministério Público, titular da ação penal,
de modo que não se revela admissível a perpetuação de medida cautelar de ofício, sob pena de violação do sistema acusatório
que informa o processo penal.
Nesse sentido, a jurisprudência:
APELAÇÃO CRIMINAL - LEI MARIA DA PENHA - AMEAÇA - MEDIDAS PROTETIVAS REQUERIDAS - VÍTIMA NÃO LOCALIZADA NO ENDEREÇO INFORMADO NOS AUTOS - MUDANÇA CARACTERIZADA - EVIDENCIADO DESINTERESSE DA VÍTIMA
- TRANSCURSO DE LAPSO TEMPORAL - AUSÊNCIA DE PERIGO IMINENTE E CONCRETO - MANUTENÇÃO DO DECISUM
- HONORÁRIOS DATIVO - FIXAÇÃO DEVIDA - RECURSO MINISTERIAL NÃO PROVIDO E FIXADO OS HONORÁRIOS DO
DEFENSOR DATIVO. 1. Em razão do caráter protetivo de referida lei, há que se conferir às medidas protetivas insertas no art.
22, a natureza jurídica de tutela inibitória, vez que categorizá-las como tutela cautelar equivale a esvaziar teleologicamente a lei,
bem como protrair indefinidamente a situação de vulnerabilidade e desproteção da mulher. 2. A concessão de tais medidas não
se vincula a qualquer condicionante, exigindo-se apenas a situação de violência no âmbito doméstico e familiar. In casu, diante
da inércia da vítima, bem como da constatação de ausência de perigo iminente e concreto, no caso específico, correta se mostra
a decisão que indefere as medidas requeridas. 3. O pleito de fixação de honorários do dativo para atuação nesta instância recursal merece acolhimento. (TJMG - Apelação Criminal 1.0024.13.100009-3/001, Relator (a): Des.(a) Kárin Emmerich, 1ª CÂMARA
CRIMINAL, julgamento em 17/11/2015, publicação da sumula em 27/11/2015). [grifos nossos]
APELAÇÃO CRIMINAL - LEI MARIA DA PENHA - INDEFERIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS - IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL - NECESSIDADE E URGÊNCIA DAS MEDIDAS NÃO CONFIGURADAS - VIOLÊNCIA IMINENTE OU ATUAL NÃO
DEMONSTRADA - RECURSO DESPROVIDO. - O deferimento das medidas protetivas, previstas na Lei Maria da Penha, está
condicionado à demonstração de sua efetiva urgência e necessidade, em face de violência atual ou iminente. Assim, o decurso