TJSP 01/03/2016 -Pág. 2447 -Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III -Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: terça-feira, 1 de março de 2016
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano IX - Edição 2066
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como seu corolário, o dever de indenizar, faz-se mister a ocorrência cumulativa de alguns requisitos, sem os quais não terá êxito
a ação reparatória. São eles: ação ou omissão voluntária do agente; culpa; relação de causalidade e dano experimentado pela
vítima.Quanto ao presente caso sob julgamento, é necessária uma análise mais detida do segundo requisito. O segundo
pressuposto para caracterizar a responsabilidade pela reparação do dano é a culpa (expressa nas modalidades negligência,
imprudência ou imperícia) ou dolo do agente que causou o prejuízo. Para se verificar se ocorreu erro de conduta e, portanto,
culpa, mister se faz comparar o comportamento do causador do dano com aquele que seria normal e correntio em um homem
médio, fixado como padrão. Se de tal comparação resultar que o dano derivou de uma imprudência, imperícia ou negligência,
nos quais não incorreria o homem padrão, criado in abstrato pelo julgador, caracteriza-se a culpa, ou seja, o erro de conduta.
Por outras palavras, agir com culpa significa atuar o agente em termos de, pessoalmente, merecer a censura ou reprovação do
ordenamento jurídico. E o agente só pode ser pessoalmente censurado, ou reprovado na sua conduta, quando, em face das
circunstâncias concretas da situação, caiba afirmar que ele podia e devia ter agido de outro modo. Ao contrário do alegado na
contestação, cabia ao réu demonstrar que a autora contratou ou utilizou os serviços. Bastava, para isso, juntar o contrato com
os documentos utilizados pela autora. Se houve fraude por terceiros, que se valeram dos dados da autora, cabia ao réu tomar
medidas que dificultem a ocorrência desses eventos, não podendo carrear ao consumidor os ônus do negócio. Inegável que a
inserção indevida do nome da autora nos órgãos restritivos do crédito causaram danos morais, que devem ser reparados. O
SPC e SERASA são bancos de dados, uma espécie do gênero arquivo de consumo. A razão de ser desses arquivos é servir ao
bom funcionamento da sociedade de consumo, pois, a partir dos dados nele constantes, compõe-se a imagem do consumidor
perante o mercado. Em suma, como o SPC e SERASA existem para registrar quem efetivamente é mau pagador, ou seja, deixa
de cumprir as obrigações assumidas por dolo ou culpa, as informações nele contidas devem ser objetivas e verdadeiras, como
prescreve o art. 43, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor. Logo, interferindo de maneira tão grave na vida comportamental
do grande público consumidor, as informações nele armazenadas devem pautar-se pela exatidão. De acordo com a lição de Rui
Stoco, “Esse registro negativo de ocorrências na prática comercial também é feito pelo SERASA Centralização de Bancos S/A,
formada como empresa criada, cujos sócios cotistas são bancos comerciais brasileiros e seria quase que um segmento da
Federação Brasileira de Bancos Febraban, com o objetivo de proteger a estrutura financeira do país, no exercício de suas
atividades. Constitui, portanto, um banco de dados, com abrangência nacional, contendo o cadastro das pessoas (físicas e
jurídicas) em todo o país” (Tratado de Responsabilidade Civil, Ed. RT, 5ª Ed., pág. 1.477). A existência destes bancos de dados
contendo informações negativas está prevista no Código de Defesa do Consumidor, mormente em seus artigos 43, § 4º. Assim,
a inserção do nome de maus pagadores nestes cadastros é atividade lícita e permitida, desde que os dados estejam corretos.
“O banco de dados dos consumidores é elemento indissociável do crédito e sua importância só pode ser medida dentro do
contexto da sociedade de consumo, com características creditícias e centrada na informação e no entendimento já esposado de
que o crédito é um ato de liberalidade do fornecedor que pode, portanto, tomar as medidas necessárias para garantir o
recebimento do valor total do bem ou serviço que está colocando no mercado” (José Carlos Gentil, in Os Bancos de Dados na
Sociedade de Consumo e o Código de Defesa do Consumidor, Brasília, 1999, p. 88, citado por aquele autor, pág. 1.478).
Provado que a inscrição foi indevida, inegáveis os danos morais sofridos pela autora.Dano moral, segundo o jurista Antônio
Chaves, mencionado por Cleyton Reis, “é a dor resultante da violação de um bem jurídico tutelado sem repercussão patrimonial.
Seja a dor física dor-sensação, como a denomina Carpenter nascida de uma lesão material; seja a dor moral dor-sentimento de
causa material” (in Dano Moral, 4ª Edição, Ed. Forense, pág. 5/6). “São lesões sofridas pelas pessoas, físicas ou jurídicas, em
certos aspectos de sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem. São aqueles que atingem a moralidade e a
afetividade da pessoa, causando-lhes constrangimento, vexames, dores, enfim, sentimentos e sensações negativas. Os danos
morais atingem, pois, as esferas íntima e valorativa do lesado, enquanto os materiais constituem reflexos negativos no patrimônio
alheio” (Carlos Alberto Bittar, Reparação Civil por Danos Morais, Tribuna da Magistratura, pág. 33).No caso dos autos, a
reparação dos danos morais prescinde da demonstração de prejuízo. Nesse sentido: “O dano simplesmente moral, sem
repercussão no patrimônio, não há como ser provado. Ele existe tão-somente pela ofensa, e dela é presumido, sendo bastante
para justificar a indenização” (TJPR, 4ª C., Rel. Wilson Reback, j. 12.12.90, RT 681/163).Assim também os precedentes do
Superior Tribunal de Justiça, como exemplifica o REsp. 53.729/MA (DJ 23.10.95). No corpo deste acórdão o E. Min. Sálvio
Teixeira assinalou: “Infundada é a pretensão do recorrente em afastar a indenização pela ausência de dano ou prejuízo. A
questão da reparabilidade de danos morais e a desnecessidade de comprovação de prejuízo já é matéria sedimentada no meio
forense. A Constituição de 1988 veio acabar com antiga discussão a respeito da possibilidade de se apurar danos morais fora
dos casos expressamente previstos no Código Civil, muito embora a dicção do artigo 159 desse texto ser suficiente para se
posicionar afirmativamente à tese.O dano moral, tido como lesão à personalidade, ao âmago e à honra da pessoa às vezes é de
difícil constatação, pois os reflexos atingem uma parte muito própria do indivíduo - o seu interior. Foi então visando a uma ampla
reparação que o sistema jurídico acatou a disciplina de não se cogitar de prova de prejuízo para demonstrar a violação do moral
humano.Sobre a matéria, doutrina Carlos Alberto Bittar que na concepção moderna da teoria da reparação de danos morais
prevalece, de início, a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação. Com
isso, verificado o evento danoso, surge, ipso facto, a necessidade de reparação, uma vez presentes os pressupostos de direito.
Dessa ponderação, emergem duas conseqüências práticas de extraordinária repercussão em favor do lesado; uma, é a dispensa
da análise da subjetividade do agente; outra, a desnecessidade de prova de prejuízo em concreto (Reparação Civil por Danos
Morais, Revista dos Tribunais, 1993, p. 202). Ruggiero, a seu turno, afirma que, para o dano ser indenizável, basta a perturbação
feita pelo ato ilícito nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos, nos afetos de uma pessoa, para produzir uma
diminuição no gozo do respectivo direito (Instituições de Direito Civil, trad. de Ary dos Santos, Saraiva, 1937)”. Inexistem
parâmetros legais para o arbitramento do valor da reparação do dano moral. Por isso, deve o magistrado coibir abusos, visando
impedir o locupletamento às custas alheias. Por outro lado, a indenização deve ser de um montante tal que coíba a empresa de
praticar atos semelhantes no futuro. Nesse caso, deve também ter natureza punitiva, e não somente reparatória. “Todavia, a
compensação da vítima tem um sentido punitivo para o lesionador, que encara a pena pecuniária como diminuição do seu
patrimônio material em decorrência de seu ato lesivo. Esse confronto de forças, de um lado a vítima que aplaca seu sentimento
de vingança pela compensação recebida, e do outro o lesionador que punitivamente peca pelos seus atos inconseqüentes, é
forma de o Estado agir para conseguir o equilíbrio de forças antagônicas. No meu entendimento, a pena pecuniária constitui-se
numa penalidade das mais significativas ao lesionador em nosso mundo capitalista e consumista, já que o bolso é a parte mais
sensível do corpo humano. Por tais razões, essa modalidade de pena é verdadeiramente um exemplo marcante o agente
causador de ato ilícito. Por conseguinte, resta a ideia de que a função satisfativa da indenização tem um sentido real de defesa
do patrimônio moral da vítima e uma punição para o lesionador. A mens legis não pode excluir da consequente compensação
qualquer dano decorrente de ato ilícito. Todos, portanto, devem ser objeto de reparação” (Cleyton Reis, in Dano Moral, 4ª
Edição, Ed. Forense, pág. 90/1). O valor de R$ 8.000,00 é adequado a compensar aquela dor psicológica sofrida, considerando
a situação econômica e social das partes, bem como as consequências do fato. Nesse ponto reside a parcial procedência do
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